sexta-feira, outubro 24, 2008

Serviço Social Praxe Fatal em Julgamento

Praxe fatal poderá custar 210 mil euros
Universidade Lusíada arrisca ter de indemnizar família pela morte de aluno praxado.
Juiz afirma haver "muro de silêncio" no curso do julgamento
Ontem
HELENA TEIXEIRA DA SILVA
Pela primeira vez em Portugal, alguém está a tentar responsabilizar uma universidade pela morte de um dos seus alunos. Diogo Macedo morreu há sete anos, depois de ter sido praxado na Lusíada de Famalicão. A mãe exige 210 mil euros.
Ontem, decorreu, na comarca de Famalicão, a segunda sessão de julgamento, no âmbito do pedido cível interposto pela família contra a Minerva - Fundação que detém a Lusíada. É a segunda vez que este caso é levado a Tribunal.
Em Outubro de 2001, quando o rapaz de 22 anos morreu, a suspeita de que teria sido vítima de uma praxe violenta - era aluno do 4º ano de arquitectura, mas na tuna académica a que pertencia ainda não tinha deixado de ser caloiro - deu origem a um processo-crime, que acabaria por ser arquivado, em 2004, por falta de provas. "É impossível imputar à acção de qualquer pessoa concreta a produção de lesões que determinaram a morte de Diogo", lê-se no despacho de arquivamento.
Ao JN, João Nabais, advogado de defesa da família do aluno, afirmou, ontem, esperar que no curso do julgamento "sejam apurados novos elementos que permitam reabrir o processo-crime", uma vez que é sua convicção que "Diogo foi sujeito a um acto de praxe especialmente violento", que lhe poderá ter provocado morte.
Esta relação de causa e efeito entre os traumatismos verificados no corpo do aluno - sobretudo, as lesões crânio-encefálicas e cervicais - e a sua morte é sustentada pelo relatório de autópsia. Antonieta Dias, a médica legista que o assinou, foi ouvida na primeira sessão de julgamento e reafirmou o que já antes escrevera: aquelas lesões "foram provocadas próximas da hora da morte" e "nunca poderiam resultar de uma só queda". A posição é corroborada e subscrita por um parecer médico-legal do professor Pinto da Costa.
Apesar disto, os elementos da tuna académica da Universidade Lusíada de Famalicão mantêm-se fiéis ao que, no decorrer da sessão, o Juiz designou como "muro de silêncio". À semelhança dos depoimentos que haviam prestado à Polícia Judiciária, os dois ex-tunos inquiridos ontem responderam à maioria das perguntas com absoluta incapacidade de recordar os acontecimentos da noite de 8 de Outubro de 2001.
É factual que Diogo Macedo entrou nas instalações por volta das 21.30 horas e que, menos de meia hora depois, já estava prostrado na casa de banho, inconsciente. É factual que foi praxado pelos elementos mais velhos da tuna, obrigado a fazer flexões, e que terá sido agredido com uma revista no pescoço. A partir daqui, uma espécie de amnésia impede os tunos de recordarem seja o que for. Não sabem os nomes de quem estava presente na Universidade naquela noite, são incapazes de revelar quem deu conta de que Diogo estaria a "sentir-se mal", interpretam a morte do colega como "um mistério".
Ouvido pelo JN, Miguel Guerreiro, director dos Serviços Académicos da Universidade Lusíada de Famalicão, afirmou não duvidar de que "a morte de Diogo não está relacionada com a praxe". Ele próprio, sublinhou, integrou uma tuna durante dez anos, nunca tendo presenciado qualquer acto de violência. Apesar disso, ressalva que "a tuna é independente da universidade".
Em 2003, muito depois de ser conhecido o relatório da autópsia, a Lusíada escreveu uma carta ao ministro do Ensino Superior, Mariano Gago, insistindo que a morte do aluno havia resultado de um derrame cerebral. Essa foi a causa de morte atestada pela certidão de óbito, mas ainda antes de ser realizada a autópsia. A próxima sessão do julgamento está marcada para o dia 14 de Novembro.

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