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quarta-feira, maio 14, 2008
segunda-feira, maio 12, 2008
VIOLÊNCIA CONTRA OS IDOSOS - uma intervenção do Dr Jorge Cabral
NÚCLEO DISTRITAL DE BEJA
REDE EUROPEIA ANTI-POBREZA /PORTUGAL
SEMINÁRIO
ENVELHECIMENTO ACTIVO: UMA VISÃO DIVERSIFICADA
REDE EUROPEIA ANTI-POBREZA /PORTUGAL
SEMINÁRIO
ENVELHECIMENTO ACTIVO: UMA VISÃO DIVERSIFICADA
VIOLÊNCIA CONTRA OS IDOSOS
JORGE DE ALMEIDA CABRAL
BEJA,
30 DE ABRIL DE 2008
Bom dia a todos,
É com imenso prazer que decorridos 18 anos, sobre a minha aventura, de ter montado em Beja, o curso de Serviço Social, aqui volto.
Obrigado pelo convite formulado, se bem que pense, que o mesmo nada tem a ver com o meu pretenso mérito, mas radica na circunstância de ter envelhecido. É que e curiosamente, eu que passei a vida, a discursar sobre os direitos das crianças, sou agora requerido para falar de idosos. Curioso e significativo…
E no entanto, só há cerca de um mês, dei conta da minha idade. Estava no Bar da Universidade, e ouvi uma aluna perguntar a outra – O velhote do Penal já chegou?
O velhote do Penal, era eu. Não me lembro de há trinta anos, alguma aluna ter perguntado pelo jovem do Penal. Claro que, se hoje quando regressar a Lisboa, me enganar na estrada, ou tiver um acidente, os jornais noticiarão: Sexagenário em contra mão, ou sexagenário vítima.
Terei perdido o nome?
Já não sou Jorge Cabral? Velhote? Sexagenário?
Qualificam, determinam, e eu tenho que me adaptar. Vêm-me velho, logo o meu comportamento tem de estar de acordo com a imagem que construíram…
Mas o que é isso de Idoso? Somos todos contemporâneos, e antes de mais, somos pessoas, de um Estado, no qual a Constituição, consigna logo no Art.º1º, a Dignidade da Pessoa Humana, como valor supremo, que deve constituir a Fonte de todos os Direitos.
Às vezes, salvo o devido respeito, quando se referem aos Idosos, até parece tratar-se de um Corpo Estranho à Comunidade, ou que a velhice consubstancie uma patologia. A vida não acaba, nem começa aos 65 anos, apenas continua… Não há vida passiva, por contraposição a vida activa.
Viver é actuar, conservando todos os direitos inerentes á pessoa humana, designadamente o de continuarem a ser eles, com os seus valores, e a sua forma de ser e de estar.
A maioria das pessoas idosas, é plenamente capaz de reger a sua pessoa e os seus bens, de amar e ser amado, de aprender, de ensinar, de se divertir, de trabalhar, de ser Feliz!
Velho não é sinónimo de Tonto, Desmiolado, Frágil ou Vulnerável. Ninguém é frágil ou vulnerável por si próprio. São os outros, que nos tornam vulneráveis. Se não existir uma galinha por perto, a minhoca morrerá de velhice…
Falar em Violência é constatar o nosso quotidiano. E de violência percebemos todos. Autores ou vítimas a exercemos e a sofrermos no dia a dia. Não é a vida qualificada como Luta? Não se combate pelo Sucesso? Não estamos determinados à Conquista do Lugar, do Estatuto, do Poder. Não nos podemos esquecer que vivemos numa Sociedade propiciadora de inúmeras violências. Constantemente aliciados para a via do que dizem ser sucesso, impõem-nos Ter, e desde a aparência física ao desempenho sexual, determinam-nos ser campeões, super-homens e super-mulheres.
Jovens, elegantes, simpáticos, encantadores, desportivos, empreendedores, são os modelos que nos transmitem, convencendo-nos que fora desses parâmetros, jamais nos realizaremos.
Então e os velhos, que fazem ainda aqui. Para que serve o meu avô, perguntava-me um pré-adolescente. É feio, está surdo, não sabe jogar no computador, e nem sequer fala inglês. Sim para que serve o avô, naquela casa, onde não come à mesa quando há visitas, dorme na arrecadação e fica aos cuidados da vizinha, quando a família vai de férias. Claro que já venderam todo o seu património, e quem recebe a reforma é a filha…
Números são números, e todos os que nos apresentam, ficarão sempre aquém da dramática realidade.
Todos os tipos de violência são exercidos sobre as Pessoas Idosas. A violência física, a violência psicológica, a exploração económica, o abuso sexual, a negligência omissiva dos cuidados necessários, o abandono físico ou afectivo, acontecem neste nossos tempo, em que tantos pregam a Solidariedade, mas habitam no seu casulo, alimentando-se de um egocentrismo militante, com que vão tratando da “vidinha”.
Violência nas Famílias. Violência nas Instituições, e o estar institucionalizado, constitui já de si uma violência, designadamente quando resulta de uma imposição familiar.
Indicam os números uma prevalência da violência psicológica, e para podermos ter uma noção mais clara da realidade precisávamos de conhecer, a idade e o nível Socio-cultural, de quem se queixa. É que infelizmente, o que para um constitui agravo ou humilhação, para outro é encarado como procedimento normal. A vítima culpabiliza-se, numa resignação sofredora…
Violência, vem de força, de vida, de vigor, de vitalidade como o étimo latino, vis indicia. Violar é forçar e coagir, porque toda a violência é coactiva, enquanto imposição, ou demonstração de Poder. E a violência verbal, a humilhação, o desprezo, a troça e mesmo a indiferença, colocam o outro, numa posição de inferioridade.
Insultar, gozar, dizer que já não andam cá a fazer nada, ou que mais valia que morressem, pode ser pior do que a violência física, consubstanciando agressões gravíssimas, à dignidade da Pessoa Idosa.
A última alteração do nosso Código Penal introduziu dois tipos criminais, os crimes de violência doméstica (Art.º 152º) e de maus-tratos (Art.º 152º - A), que podem assumir grande relevância, se e quando bem aplicados.
Ambos referem, os maus-tratos físicos ou psíquicos, os castigos corporais, as privações da liberdade, as ofensas sexuais, e o de maus-tratos, acrescenta o tratamento cruel.
Constituem crimes públicos, pelo que podem ser denunciados por qualquer pessoa.
Infelizmente a minha fé na intervenção do Direito penal, é limitada. Tradicionalmente o nosso Direito, privilegiava a violência física, porque é a que deixa cicatrizes, marcas no corpo, a mais visível.
Porque as palavras doem, a humilhação tortura e a negligência mata, será importante olharmos a ofensa numa perspectiva vitimológica. Tudo o que produz sofrimento, que entristece, que indignifica, que compromete a sanidade da Pessoa é violência, e como tal deve ser encarado pelo estado através dos Tribunais, e principalmente pela Sociedade, por todos nós.
Só dessa forma, será curial interiorizar a gravidade do crime, e apenas com essa interiorização comunitária, se tornará possível, a aplicação da Lei, em toda a sua plenitude.
Claro que não resolveremos o Problema através da Repressão Penal, cuja eficácia motivadora é como todos sabemos, extremamente reduzida.
Imperioso é fazer cumprir a Constituição, que não nos esqueçamos, obriga o Estado a implementar uma Política de Terceira Idade que englobe medidas de carácter económico, social e cultural tendentes a proporcionar às Pessoas Idosas, oportunidades de realização pessoal, através da uma participação activa na Comunidade. Participação que só poderá efectivar-se quando a própria Comunidade, estiver consciencializada, que abrange todos, novos e velhos, não existindo jamais nós e os outros, porque somos todos nós.
O velho não é uma peça de museu, nem voltou a ser criança, merece respeito, enquanto Cidadão, Sujeito, de todos os direitos inerentes à sua Dignidade de Homem Livre.
A violência contra as Pessoas Idosas vai agravar-se se não apostarmos na Educação das nossas Crianças, para a Solidariedade e se não assumirmos de vez, que a “ratio económica” não pode constituir um valor absoluto, que domine a Verdade e mate a Ética.
Sendo hoje já um Problema Mundial, chegou mesmo às Sociedades africanas, como ainda recentemente afirmou o grande escritor Mia Couto, considerando que “o actual universo de miséria absoluta vai corroendo aquilo que antes era dominado pelo respeito” e que “num mundo ajoelhado perante a mercadoria, está a suceder em África o que já sucede noutros pontos do mundo – os velhos e as crianças estão desvalorizadas porque produzem pouco e compram ainda menos”…
Que fazer? Se não lutar, e responsavelmente construir um Mundo Novo, no qual a cultura do efémero, do monólogo e do Ter, dêem lugar ao Tempo da Felicidade, Felizes com o nosso Corpo, com a nossa Idade, com as Nossas Diferenças, fruindo a Vida, com a profunda Harmonia de nos sentirmos de Bem connosco, e em comunhão com os outros, todos nossos companheiros de jornada, e irmãos nesta aventura de ser e de estar Vivo.
Acredito. Vai ser Possível.
Utópico, eu?
Talvez!!!
Mas quem pode viver sem Utopia?
Muito Obrigado!
Jorge Cabral
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