O cientista James D. Watson fez escândalo numa entrevista ao Sunday Times. Agora, lamenta: "Não compreendo como pude dizer aquilo que foi citado. Não há bases científicas para tal." E que disse ele na entrevista, publicada no domingo passado?
Watson, de 79 anos, prémio Nobel de 1962 por pesquisas sobre o ADN, disse que África não se desenvolvia porque "todas as nossas políticas sociais são baseadas no facto de que a inteligência deles [dos africanos] é igual à nossa - ora as provas não dizem isso". E que provas? Ele diz: "Quem lida com empregados negros sabe que isso não é verdade [a igualdade da inteligência]."Quase concordo com James D. Watson. De facto, também a minha experiência em lidar com empregados quase sempre diz que sou mais inteligente que eles. Acontece, porém, que além da minha experiência de empregador (uma mulher-a-dias aqui, um canalizador ali) tenho uma experiência de empregado. E suspeito que nessa qualidade sou eu quem é quase sempre menos inteligente. Digo "suspeito" porque é o que sinto quando vejo, de cada vez que assino um contrato, o sorrisinho malandro do meu novo patrão. Donde, o que o dr. Watson devia ter dito é que os empregados são geralmente mais estúpidos que os patrões, e por isso não chegaram a patrões.Então, porque leva ele a questão para as diferenças entre brancos e negros? Comprei o último livro de Watson. É um livro para ser lido logo pelo título. Na edição americana, Avoid Boring Other People, o Other é impresso quase transparente, o que, sem esse "Outras", permite duas leituras: uma, "Evite Aborrecer as Pessoas", e outra, "Evite as Pessoas Aborrecidas". Watson gosta de ser irónico. Conta a sua vida, tirando lições no fim de cada capítulo. Lição (no capítulo "Como Fazer Livros Legíveis"), citando Oscar Wilde: "A mensagem do meu primeiro encontro com a aristocracia foi clara. Eu não voltaria a ser convidado se me portasse como ela." Quer dizer, Watson faz da provocação, do ser diferente, a sua divisa. Brincou com o fogo, com a história dos negros e dos brancos. No dia em que ouvi falar da polémica, estava em Nova Iorque e fui ouvir o Requiem, de Mozart, pela Orquestra Sinfónica de Londres. É perigosíssimo ouvir aquilo horas depois de ouvir um cientista falar sobre a superioridade dos brancos. Dois dias depois, na sexta, fui ao Lincoln Center, ouvir a orquestra de jazz dirigida por Wynton Marsalis (um negro) assinalando o centenário do compositor Benny Carter (um negro). E houve um momento em que o gordo e negro Sherman Irby se levantou e, com o seu saxofone alto, tocou Again and Again... Só não me convenci da superioridade negra porque ao seu lado estava Joe Temperley e Ted Nash, ambos brancos.