Para Maria Liège, apenas o fato de o Estado ter “assumido para si a questão das políticas públicas voltada à mulher e de ter reconhecido a discriminação na sociedade” já representa um grande avanço. Como exemplo de ação eficaz, Maria Liège destacou o serviço de denúncias pelo telefone 180, disponibilizado em todo o país: “O 180 tem sido um serviço fundamental no enfretamento da violência contra a mulher”. Ainda com relação à violência doméstica, foi debatida a promulgação da Lei “Maria da Penha”, nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, que amplia para até três anos de prisão a pena para homens que agridem mulheres. Maria da Penha Maia, hoje com 60 anos, tornou-se ícone na luta contra a violência doméstica quando aos 38 anos ficou paraplégica por levar um tiro do marido, enquanto dormia.
Dificuldades da prática
Além das palestras de abertura, o Seminário contou com mesas-redondas compostas por assistentes sociais que atuam com as questões de gênero, caso do Serviço de Aborto Legal do Hospital Artur Ribeiro de Sabóia, cuja representante, Irotilde Gonçalves Pereira, falou sobre uma das principais dificuldades enfrentadas nessa atuação, a quebra do silêncio: “Elas muitas vezes chegam aos hospitais em estados deploráveis, mas não assumem, para os médicos, que sofrem violência doméstica”.
A discriminalização do aborto foi outro ponto levantado. “Além de constituir como um problema de saúde pública no Brasil, o aborto configura com uma grave injustiça social. As mulheres que provocam o aborto e procuram o serviço público vão com insegurança e medo de serem denunciadas, porque, a rigor, pelo Código Penal, a mulher que provoca o aborto tem que ser denunciada”, afirma Irotilde.
Graziela Pavez, coordenadora do Centro de Referência de Combate à Violência Contra a Mulher/Casa Eliane de Grammont, ampliou a dificuldade da quebra do silêncio para além do lar: “Quando a violência envolve as relações com vizinhos, com a família ampliada ou relações com o trabalho a mulher se cala e não declara o problema, pensando estar fora do seu direito”.
Ivanilda Josefa da Silva, da Sociedade Santos Mártires/Casa Sofia, que atende na região do extremo sul da Capital paulista, destacou a falta de apoio da rede pública com os assistentes sociais. “Não adianta nós, assistentes sociais, darmos o caminho por onde a mulher deve seguir se não temos o apoio da rede pública de serviço. Ela acaba desistindo, porque é maltratada na Delegacia da Mulher, porque não consegue ser atendida no judiciário e porque a família não a apóia. Nossa ação é, muitas vezes, barradas por outras ações que vêm na direção contrária”, diz Ivanilda.
A falta de continuidade do atendimento público foi também abordada por Vanessa Orsoli, da Casa Abrigo Regional do ABC: “Quando as redes públicas, parcial ou totalmente, não funcionam, causam grandes problemas para as mulheres, principalmente para as que estão se desligando da Casa abrigo”, ela afirmou. Eloísa Gabriel, da ONG Serviço à Mulher Marginalizada, apontou ainda a questão do tráfico para exploração sexual de mulheres, que não pode ser combatido sem políticas sociais. “O tráfico de pessoas não é um crime a ser combatido apenas com polícia. Exige um acompanhamento mais abrangente, para o que as políticas sociais são extremamente importantes. O problema é que elas quase não existem nessa área”.
A luta contra a discriminação a gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transgêneros foi o tema de Marcos Valdir Silva, do Fórum Paulista GLBTT: “ Essa comunidade não pode ser vista apenas pela Parada do Orgulho Gay, na Avenida Paulista. Precisa ser vista e pensada em todos os dias do cotidiano e no momento da elaboração das políticas públicas de nosso Estado e de nosso país ”. Participaram ainda do Seminário Greice Oliveira, da ONG Pró-Mulher, Família e Cidadania, que “tem como objetivo a defesa da mulher por oferecimento de ações judiciais”; Leandro Mazzo, da Casa de Acolhida de Santo André e Centro Social Eliodor Hess, que trabalha especificamente com o universo masculino e tem como alvo principal “erradicar a violência a partir dos próprios sujeitos que a comentem”, e representantes do Centro de Apoio à Mulher em Situação de Violência da Pref. Municipal de Santo André e da Coordenadoria de Assistência Social da USP.
No decorrer do Seminário, foram tirados indicativos de encaminhamentos, tais como:
1) Solicitação pelo Conjunto Cfess/Cress de uma audiência com a ministra Nilcéa Freire, na qual seria debatida a relação da Lei “Maria da Penha” com o Sistema Único de Assistência Social (SUAS);
2) Divulgação aos profissionais de SS sobre a possibilidade de apresentarem projetos a serem financiados e articulados pela Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres;
3) Atuação do Núcleo de Gênero do Cress SP junto ao grupo virtual articulado por colegas do Paraná;
4) Continuidade do Seminário ou montagem de curso para as onze Seccionais do Cress SP, sobre o tema.
* o cartaz não corresponde ao informativo, mas é belo e exemplifica a preocupação sobre o tema