Corpos, Sexualidades e Violências Sexuais
Jorge Cabral
Presidente do Instituto de Criminologia
Amavelmente coagido a estar aqui e a falar, desconheço em que qualidade a Profª. Marlene, me pretende, se enquanto Director do Instituto de Criminologia, seu antigo professor ou estudioso do tema. Prefiro porém pensar que a imposição – convite se dirigiu ao Amigo.
Mas ainda assim, foi corajosa ao assumir o risco, pois sabe, que não sou homem para palavras de circunstância ou panegíricos fáceis, antes me caracteriza o labor desconstrutivo, nunca hesitando a gritar quando o rei vai nu.
Corpo, Sexualidade e Violência Sexual, é a obra que eu intitularia Corpos, Sexualidades e Violências.
Do corpo Real, Do Corpo Imaginário, Do corpo Virtual, da Bio-sexualidade, da Psico-Sexualidade, da Sócio-Sexualidade, da Violência Lícita ou Ilícita, Visível ou Invisível, Explícita ou Implícita, trata a Autora, numa perspectiva vitimológica, fornecendo num vigoroso, lúcido e útil estudo, e apontando metas e estratégias aptas a uma mais fundada intervenção. Certamente que no futuro alargará o campo sob investigação, pois a quotidiana mutabilidade da violência sexual, impõe novas categorizações, ampliando aqui e restringindo ali, noções e conceitos, de delinquente, vítima, agressão sexual, licitude e de ilicitude, o que em primeira linha trará enormes dificuldades à Dogmática Penal.
Em quarenta anos o Direito Penal Sexual vem sofrendo profundíssimas alterações. Do valor protegido Honestidade da Mulher, ao bem jurídico Liberdade Sexual, os Códigos Penais tentam adaptar-se, à evolução dos costumes sexuais, não abdicando porém (e ainda) de exercer o controlo social, mas limitando a intervenção à defesa de bens jurídicos fundamentais, neste caso, a liberdade sexual, enquanto vector da Categoria Ampla Liberdade. Afastadas foram assim todas as alusões ao pudor, á honestidade, ao escândalo público, à moral colectiva. Um Código Penal não é um Código Moral. Aliás já em 1859, Stuart Mill, escrevia que “o único objectivo que legitima o exercício do poder sobre qualquer membro de uma comunidade civilizada, contra a sua vontade, é evitar a ocorrência de um dano alheio. O seu próprio bem, quer físico, quer moral, não constitui justificação suficiente. Sobre si próprio, sobre o seu próprio corpo e espírito, o indivíduo é soberano”.
Crimes sem vítima devem ser evitados, mas também uma normativa vitimização, como acontecia no Crime de Estupro, e ainda acontece nalguns casos de adolescentes. Aliás o meu interesse por esta temática, surgiu através de um caso de estupro, ocorrido no início dos anos 70. A ofendida com 17 anos engravidara, vivia feliz com o autor da gravidez. Provado o desfloramento e o consentimento para a cópula, o homem foi condenado a dois anos de prisão. A denúncia partiu dos pais da rapariga, que entretanto haviam perdoado o que era na altura irrelevante face à Lei em vigor.
Que valores defenderam então aqueles Juízes? A Honestidade? A Moralidade? A Honra? A Virgindade?
Entre o Código de então e o actual a diferença é abismal. Obviamente que hoje o Homem não teria cometido nenhum ilícito criminal. As leis mudam! E a cabeça das pessoas? Da paisagem subjacente ao velho Código de 1886, do Homem – predador armado do pénis, caçando as mulheres, a este nosso tempo, que queremos mais igualitário, muito se modificou.
A assumida dissociação entre a relação sexual e a procriação, a luta das mulheres pela igualdade em todos os domínios da vida social, os progressos da Sexologia, a publicação de diversos relatórios sobre Comportamento Sexual, trouxeram uma maior compreensão da sexualidade alheia e própria, quebrando muitos tabus.
Mas teremos chegado no plano sexual, à igualdade entre Homem e Mulher? Conseguimos abater todos os mitos? Ou vivemos ainda numa Sociedade, eminentemente falocrática, na qual a sexualidade é só e apenas a genitalizada. Será que iremos passar do sexo, como coisa que os homens fazem às mulheres, para uma coisa que as mulheres fazem aos homens?
Quem conquista quem? E quem se rende?
Ou utilizando a linguagem vulgar – Quem come quem? O António comeu a Maria? Ou foi a Maria que comeu o António?
Serão ainda aplicáveis as lições que o meu avô me deu – A mulher para o dever e puta para o prazer, e “quando uma mulher diz não, quer dizer sim?”
Existe na relação sexual o activo e o passivo? Continuará a parecer mal a iniciativa da mulher?
Pois não ouvi já, clamores contra a denominada masculinização na Mulher?
A verdade é que coexistem diferentíssimas concepções da sexualidade. As miúdas, que como relata, a última Revista Sábado, têm relações sexuais na Escola, e as prostitutas – avós da Praça da Figueira, que criticam as jovens, pois elas não fazem porcarias, é só ao natural, pertencem a este nosso tempo, liberal, hiper-sexualizado, hedonista, e egocêntrico.
Também aqui e como sempre, só através da Educação, será possível edificar uma Cultura de Igualdade, entre Homem e Mulher, na qual o exercício da Sexualidade, constitua um factor determinante na auto-realização da Pessoa, compatibilizando o Afecto e a Dignidade.
Resta-me concluir. Já não interrogo!
Afirmo, constituir este Livro, da minha Amiga Marlene, um extraordinário contributo, para a compreensão da Vitima de Crimes Sexuais, razão porque me atrevo a aconselhar a sua leitura, não só aos Profissionais, mas a todos aqueles que teimam em sonhar, com uma Sociedade mais Saudável e Livre, logo mais Feliz.
Muito obrigado!
Mas ainda assim, foi corajosa ao assumir o risco, pois sabe, que não sou homem para palavras de circunstância ou panegíricos fáceis, antes me caracteriza o labor desconstrutivo, nunca hesitando a gritar quando o rei vai nu.
Corpo, Sexualidade e Violência Sexual, é a obra que eu intitularia Corpos, Sexualidades e Violências.
Do corpo Real, Do Corpo Imaginário, Do corpo Virtual, da Bio-sexualidade, da Psico-Sexualidade, da Sócio-Sexualidade, da Violência Lícita ou Ilícita, Visível ou Invisível, Explícita ou Implícita, trata a Autora, numa perspectiva vitimológica, fornecendo num vigoroso, lúcido e útil estudo, e apontando metas e estratégias aptas a uma mais fundada intervenção. Certamente que no futuro alargará o campo sob investigação, pois a quotidiana mutabilidade da violência sexual, impõe novas categorizações, ampliando aqui e restringindo ali, noções e conceitos, de delinquente, vítima, agressão sexual, licitude e de ilicitude, o que em primeira linha trará enormes dificuldades à Dogmática Penal.
Em quarenta anos o Direito Penal Sexual vem sofrendo profundíssimas alterações. Do valor protegido Honestidade da Mulher, ao bem jurídico Liberdade Sexual, os Códigos Penais tentam adaptar-se, à evolução dos costumes sexuais, não abdicando porém (e ainda) de exercer o controlo social, mas limitando a intervenção à defesa de bens jurídicos fundamentais, neste caso, a liberdade sexual, enquanto vector da Categoria Ampla Liberdade. Afastadas foram assim todas as alusões ao pudor, á honestidade, ao escândalo público, à moral colectiva. Um Código Penal não é um Código Moral. Aliás já em 1859, Stuart Mill, escrevia que “o único objectivo que legitima o exercício do poder sobre qualquer membro de uma comunidade civilizada, contra a sua vontade, é evitar a ocorrência de um dano alheio. O seu próprio bem, quer físico, quer moral, não constitui justificação suficiente. Sobre si próprio, sobre o seu próprio corpo e espírito, o indivíduo é soberano”.
Crimes sem vítima devem ser evitados, mas também uma normativa vitimização, como acontecia no Crime de Estupro, e ainda acontece nalguns casos de adolescentes. Aliás o meu interesse por esta temática, surgiu através de um caso de estupro, ocorrido no início dos anos 70. A ofendida com 17 anos engravidara, vivia feliz com o autor da gravidez. Provado o desfloramento e o consentimento para a cópula, o homem foi condenado a dois anos de prisão. A denúncia partiu dos pais da rapariga, que entretanto haviam perdoado o que era na altura irrelevante face à Lei em vigor.
Que valores defenderam então aqueles Juízes? A Honestidade? A Moralidade? A Honra? A Virgindade?
Entre o Código de então e o actual a diferença é abismal. Obviamente que hoje o Homem não teria cometido nenhum ilícito criminal. As leis mudam! E a cabeça das pessoas? Da paisagem subjacente ao velho Código de 1886, do Homem – predador armado do pénis, caçando as mulheres, a este nosso tempo, que queremos mais igualitário, muito se modificou.
A assumida dissociação entre a relação sexual e a procriação, a luta das mulheres pela igualdade em todos os domínios da vida social, os progressos da Sexologia, a publicação de diversos relatórios sobre Comportamento Sexual, trouxeram uma maior compreensão da sexualidade alheia e própria, quebrando muitos tabus.
Mas teremos chegado no plano sexual, à igualdade entre Homem e Mulher? Conseguimos abater todos os mitos? Ou vivemos ainda numa Sociedade, eminentemente falocrática, na qual a sexualidade é só e apenas a genitalizada. Será que iremos passar do sexo, como coisa que os homens fazem às mulheres, para uma coisa que as mulheres fazem aos homens?
Quem conquista quem? E quem se rende?
Ou utilizando a linguagem vulgar – Quem come quem? O António comeu a Maria? Ou foi a Maria que comeu o António?
Serão ainda aplicáveis as lições que o meu avô me deu – A mulher para o dever e puta para o prazer, e “quando uma mulher diz não, quer dizer sim?”
Existe na relação sexual o activo e o passivo? Continuará a parecer mal a iniciativa da mulher?
Pois não ouvi já, clamores contra a denominada masculinização na Mulher?
A verdade é que coexistem diferentíssimas concepções da sexualidade. As miúdas, que como relata, a última Revista Sábado, têm relações sexuais na Escola, e as prostitutas – avós da Praça da Figueira, que criticam as jovens, pois elas não fazem porcarias, é só ao natural, pertencem a este nosso tempo, liberal, hiper-sexualizado, hedonista, e egocêntrico.
Também aqui e como sempre, só através da Educação, será possível edificar uma Cultura de Igualdade, entre Homem e Mulher, na qual o exercício da Sexualidade, constitua um factor determinante na auto-realização da Pessoa, compatibilizando o Afecto e a Dignidade.
Resta-me concluir. Já não interrogo!
Afirmo, constituir este Livro, da minha Amiga Marlene, um extraordinário contributo, para a compreensão da Vitima de Crimes Sexuais, razão porque me atrevo a aconselhar a sua leitura, não só aos Profissionais, mas a todos aqueles que teimam em sonhar, com uma Sociedade mais Saudável e Livre, logo mais Feliz.
Muito obrigado!
Prof. Jorge Cabral
Lisboa 2007
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