segunda-feira, janeiro 26, 2009

Direitos Humanos e Serviço Social Movimentos Feministas contestam Presidente Daniel Ortega

Organizações de mulheres presentes à Cúpula dos Povos do Sul (Salvador/ 12-15 de dezembro) criaram uma petição eletrônica repudiando a presença do presidente nicaragüense, Daniel Ortega, à Cúpula da América Latina e do Caribe, que deve reunir 33 mandatários da região. O repúdio se apóia na perseguição às mulheres, que Ortega tem liderado em seu país e por chocante sua biografia.
Pelo mesmo motivo, Ortega foi rechaçado durante a XVIII Cúpula Iberoamericana realizada em El Salvador, em outubro deste ano. Na ocasião, organizações feministas locais colocaram faixas ao longo da rodovia por onde transitaram os chefes de estado, onde se lia:
“Condenamos a perseguição do governo da Nicarágua contra defensoras dos diretos das mulheres”.
Manifestações simultâneas aconteceram em frente às embaixadas ou consulados da Nicarágua no México, Panamá, Honduras e Guatemala. No Uruguai, país onde a Nicarágua não possui representação diplomática, foram publicados artigos em jornal e realizada uma reunião no Ministério das Relações Exteriores, com entrega de um dossiê com as denúncias sobre o que se passa na Nicarágua.
Um pouco da história - Dezessete anos depois de ser derrotado por Violeta Chamorro, em 1990, Daniel Ortega, conseguiu vencer as eleições presidenciais em 2006, com o apoio de Rosario Murillo, sua mulher e coordenadora da campanha eleitoral. Foi uma eleição com baixo comparecimento e Ortega obteve 38% dos votos. Sua apertada vitória foi possível em razão do pacto que fez com segmentos liberais e com a hierarquia católica. Parte do acordo político, foi assumir a ratificação da lei que abolia do Código Penal o direito ao aborto terapêutico -aquele que é realizado nos casos de estupro e de risco de vida para a mulher.
Violência familiar – Oito anos depois de Ortega ter sido derrotado por Chamorro, e quando cumpria mandato no Legislativo, a sociedade nicaragüense foi sacudida pela revelação do incesto por ele praticado contra sua filha adotiva Zoilamérica Nárvaez. A jovem escreveu um Testemunho contra o padrasto, revelando detalhes sobre os anos de tortura que enfrentou, em silêncio, no seio da família. Mas as agressões de Ortega ficaram impunes, sob o argumento de sua imunidade parlamentar e, posteriormente, sob a alegação de prescrição do delito, acatada por uma juíza que depois do episódio se tornou Magistrada da Corte Suprema de Justiça da Nicarágua.
Mandato autoritário – O mandato de Ortega tem se caracterizado pela polarização e criação de um ambiente de perseguição e medo na sociedade nicaraguense. Já foram postos na ilegalidade o Partido Conservador e o Movimento de Renovação Sandinista (MRS), este fundado por quadros históricos da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN). Espaços públicos têm sido ocupados para evitar manifestações de oposição, e quem denuncia os abusos praticados -como líderes do movimento de mulheres, poetas, intelectuais, jornalistas ou líderes da sociedade civil- pode ser alvo de auditorias fiscais arbitrárias, expulsão dos serviços públicos ou diversos tipos de ameaças.
ONGs e Centros de Mulheres vêm sendo controladas por ministérios -inclusive o Ministério da Saúde e de Serviço Social- sendo a Red de Mujeres contra la Violencia alvo especial dessa perseguição. A jornalista Sofía Montenegro, premiada internacionalmente por seu trabalho, foi acusada de ser agente da CIA, quando na verdade é uma lutadora pela justiça e igualdade das mulheres. Cresce a perseguição contra feministas, que vêm sofrendo ataques e ameaças a suas vidas e à de suas famílias. Ações na Justiça e campanhas de mídia, por parte de autoridades estatais, têm o objetivo de amedrontar e desmoralizar essas mulheres, o que se atribui a suas manifestações contra o regime e contra a penalização do aborto, e ao fato de apoiarem a denuncia feita por Zoilamerica Narváez. Essas informações nos chegam a partir de lideranças do movimento de mulheres, que regionalmente lutam em defesa da democracia na Nicarágua.
Proibição do aborto – Em outubro de 2006, à revelia dos apelos vindos de segmentos que defendem os direitos reprodutivos, e sob forte influência católica, o Parlamento nicaragüense aprovou a mudança no texto do Código Penal, vigente há 159 anos. Em 2007, já sob o governo de Ortega, foi ratificado o novo texto, estabelecendo-se a penalização das mulheres que recorram ao aborto, agora também nos dois casos antes permitidos.
Comissão Interamericana de Direitos Humanos atenta – Em outubro deste ano a situação da Nicarágua foi debatida a partir de uma manifestação conjunta levada ao organismo da ONU por quatro instituições: Centro de Direitos Reprodutivos, CLADEM, Human Rights Watch e Mulabi/ Espacio Latinoamericano de Sexualidades y Derechos. O objetivo foi levar proteção às nicaragüenses que estão sob ameaça. Na audiência, a responsável pelo Programa de Litígio Internacional de CLADEM, Valéria Pandjiarjian, afirmou:
“As pessoas que trabalham pelos direitos das mulheres devem deixar de ser submetidas a ataques e desrespeito por parte de funcionários governamentais”.
Foi a partir desse contexto que organizações e redes de mulheres protestaram contra a vinda de Ortega ao Brasil, inclusive exibindo faixas e discursando na passeata de encerramento da Cúpula dos Povos do Sul, em Salvador.
Leia mais:Carta do Movimento Autônomo de Mulheres da Nicaráguadenuncia as constantes perseguições por parte do governo
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