Falta prevenção aos maus-tratos infantis
Data: 16/12/2007
Estudo científico coordenado pela pesquisadora e doutora em Serviço Social, Amábile Furlan, diagnosticou que Limeira não apresenta programas específicos de atendimento e prevenção aos maus-tratos infantis. A ausência deixa o Conselho Tutelar e as famílias sem opção e as ações ficam restritas em momentos posteriores ao problema.A conclusão é com base em dados qualitativos de um estudo regional financiado pelo Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (Condeca), executado pelo Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cedeca) e feito por Amábile com o auxílio dos estagiários do curso de Serviço Social do Isca Faculdades, Alex Adilson Paulon, Andréa Letícia Fernandes e Tatiana Coelho. Além de Limeira, o estudo também foi feito em Araras, Artur Nogueira, Conchal e Iracemápolis.Amábile entrevistou conselheiros tutelares e diretores de entidades e casas de abrigo de Limeira. Em seu relatório, apontou que a conseqüência direta da falta dos programa de prevenção é a valorização do caráter punitivo, fiscalizador e policial do conselhos Tutelar e do Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA). “O relacionamento entre abrigos, conselhos, secretarias, escolas e comunidades mostraram uma realidade bastante conturbada e distante do verdadeiro funcionamento da rede. É premente traçar objetivos a curto, médio e a longo prazos”, relata.Segundo o diagnóstico, o caráter punitivo das denúncias de maus-tratos dificulta o trabalho e gera clima de tensão e desconforto, além de acentuar o distanciamento entre as famílias e os conselhos. “As famílias ficam com medo e o problema não é solucionado”, afirma a pesquisadora. Outra conclusão foi que o número de crianças abrigadas é alto no município, a porcentagem de retorno às famílias de origem é baixa e que o abrigamento não é uma “intervenção temporária”. “A criança é bem cuidada, mas fica até os 18 anos sem um vínculo familiar. Quando ele sai, não tem apoio de mais ninguém na sociedade”, salienta Amábile.Dos quatro abrigos consultados no estudo, três tinham a capacidade máxima, o que impedia o atendimento personalizado e de qualidade - foi recomendado que elas trabalhem com número menor de crianças abrigadas. Outra característica detectada é a separação de sexos, como ocorre com o Nosso Lar (só meninos) e a Casa da Criança Santa Terezinha (só meninas). “A separação desfaz laços fraternais e apresenta situações artificiais às crianças e adolescentes”, diz o relatório. Mas, para a professora, a unificação exige cuidados e atenções especiais. DADOS E TENDÊNCIASAprovado no ano passado, o estudo trabalhou com dados entre 2003 e 2005. Durante o período, houve um crescimento nos casos de maus-tratos infantis registrados no Conselho Tutelar.
Em 2005, foram 1.199, contra 1.157 do ano anterior - aumento de 3,6%. Em três anos, foram 2.829 casos.Durante o período analisado, foram 159 maus-tratos físicos, 26 emocionais, 545 negligências, 76 abandonos, 59 abusos sexuais, 171 casos de corrupção (drogas e prostituição), 29 de exploração de mendicância e mais 1.764 classificados como “outros”, onde figuram evasão escolar, pedido de guarda, situação irregular, desaparecimento, danos, pichações, mal comportamento, fuga, furto, problemas com a polícia, falta de CNH ou de documentos e ameaças.A maior parte das ocorrências foram localizadas na região Oeste, que abrange desde o Parque Nossa Senhora das Dores e Águas da Serra ao Jardim Ipanema, das Palmeiras, Recanto Verde e Adélia Cavicchia.
Nessa área, há bastante presença de famílias de baixa renda. Foram 1.809 (38%) dos casos. Amábile, no entanto, faz observações cautelosas. “Fatores de risco e vulnerabilidade não devem ser confundidos como sinônimos de pobreza, para não gerar rótulos ou preconceitos”, disse.A Zona Sul (São Lourenço, Montezuma, Gustavo Picinini, Regina Bastelli, Ernesto Kühl, Aeroporto, Odécio Degan e Lagoa Nova), vem em 2º lugar, com 679 casos (24%), seguida de perto pela Zona Norte (Teixeira Marques, Hortênsia, Egisto Ragazzo, Santo André, Santana e Piratininga), com 620 registros (21%), e, por último, a Zona Leste (Parque Hipólito, Olga Veroni, Novo Horizonte, Nova Suíça, Vista Alegre e Parque Hipólito), com 266 casos (9%).Uma característica observada pela pesquisadora é que os meninos correspondem a 60% dos casos de maus-tratos físicos; já as meninas são a maioria nos casos de abusos sexuais. Há diferenças entre os sexos nas faixas etárias. Entre as de menor idade, as meninas são as que mais sofrem com maus-tratos, mas, à medida que a idade avança, são os meninos. Entre os menores acima de 11 anos, por exemplo em 2005, foram 354 maus-tratos em meninos e 215 em meninas. “Quando se chega perto da adolescência, o mundo das drogas também fica mais perto”, avalia Amábile.Quando se consulta os encaminhamentos feitos, a falta de atendimentos específicos fica mais clara quando se constata que os procedimentos mais comuns são a orientação e o acompanhamento, feito pelos próprios conselhos. Na observação sobre quem denuncia, além dos pais, quem se destaca é a polícia civil. Para a pesquisadora, fica nítido o cuidado das autoridades policiais limeirenses sobre o assunto, mas há ressalvas. “Pode ser mais um indicativo da prevalência do caráter policiador dos conselhos”, revela Amábile
SOLUÇÃOO trabalho científico também apresenta sugestões de melhorias. Segundo a pesquisadora, é fundamental, de início, desfazer o caráter punitivo e fiscalizador dos conselhos e torná-lo de apoio e auxílio, por meio de campanhas públicas de esclarecimento. Também se faz necessária uma mudança de postura dos profissionais. “Devemos substituir a palavra denúncia por registro”, salienta.Amábile defende a criação de um projeto de capacitação continuada aos conselheiros. “Há um esforço, mas não há uma política de acompanhamento”, diz. A pesquisadora sugere a formação de equipes permanentes para realizar pesquisas e a criação do Sistema de Proteção Integral à Infância e à Família. “As ações devem envolver toda a população e são contínuas”.De acordo com a pesquisadora, Limeira tem uma realidade bastante parecida com as demais integrantes do estudo, mas com um diferencial. “Nas outras cidades, encontramos problemas de infra-estrutura. Artur Nogueira não tinha dados do ano de 2003.
Em Limeira, temos recursos, mas faltam monitoramento e avaliação”, conclui. O relatório foi encaminhado para o Conselho Tutelar. (RS)
MAUS-TRATOS INFANTIS
2003-2005 Registros
Físico 159
Emocional 26
Negligência 545
Abandono 76
Abuso sexual 59
Corrupção 171
Mendicância 29
Outros 1.764
Total 2.829
Fonte: Estudo, Pesquisa e Diagnóstico sobre Maus-Tratos Infantis
Jornalista: Gazeta de Limeira
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